segunda-feira, 18 de junho de 2012

Sobre Luiza Erundina, em 2009.

Sobre a Deputada Federal Luiza Erundina, em novembro de 2009, escrevi pequeno depoimento, que Frederico Vasconcellos publicou:
"11/11/2009

Depoimento de magistrado sobre Luiza Erundina

De Alfredo Attié Jr
Sobre a iniciativa de auxílio à ex-prefeita de São Paulo Luiza Erundina (PSB), condenada a pagar R$ 353 mil para a Prefeitura, pela publicação, em sua gestão, de anúncio que tratava do apoio à greve geral dos transportes, em março de 1989:
Deparei-me com a noticia da condenação e da atuação de amigos e populares, para auxiliar a Prefeita Erundina. Tendo sido Prefeita de São Paulo, Ministra e Deputada, seu patrimônio se resume, aos 74 anos, a um apartamento e dois automóveis.
Permito-me comentar, brevemente a iniciativa, que considero correta.
Ainda criança, compareci à cerimônia de homenagem a meu pai, que se aposentava da cadeira de psicologia social, quando presenciei o belo discurso que a então professora Erundina fez em sua homenagem. Já se destacava como política engajada e comprometida com as causas sociais.
Política honesta e digna, venceu a eleição em São Paulo, nos primórdios da história política do PT, quando amealhou aos quadros da Administração paulistana intelectuais de altíssima capacidade, como foi o caso da professora Marilena Chauí, a par de jovens militantes, que depois vieram a abrilhantar a história de conquistas do mesmo Partido dos Trabalhadores ou a advocacia brasileira. Muitos deles meus queridos ex-alunos da FDUSP, da cadeira de Filosofia e Filosofia do Direito, na qual lecionava, como assistente do Prof. Aloysio F. Pereira.
Teve uma breve e ótima gestão, voltada para a recuperação da cidade e para a construção de programas sérios de política pública e justiça social.
O auxílio a Luiza Erundina é correto, tendo em vista suas qualidades pessoais. Ainda mais, servirá como um exemplo à sociedade: há pessoas corretas e bons modelos na política, independentemente de ideários, homens e mulheres admiráveis!
(*) Magistrado, Doutor em Filosofia da Universidade de São Paulo, Mestre em Filosofia e Teoria Geral do Direito pela FD.USP, cursa o MCL da CSL, realizou estudos, pesquisas, publicou artigos e apresentou comunicações no Brasil e no Exterior (Argentina, EUA, México, Inglaterra, Alemanha, França, Portugal). Foi Advogado e Procurador do Estado de São Paulo.
Escrito por Fred às 17h37"
In http://blogdofred.folha.blog.uol.com.br/arch2009-11-08_2009-11-14.html

segunda-feira, 11 de junho de 2012

" Deixem o desgraçado em paz, peço-lhes"




Essa, acho eu, vale muito a pena. Por isso ecrevo a introdução.
Pela a mizade, que só a amizade permite que você suporte e elogie os idiotismos chatos de um amigo erudito.
Mas vale pelo sofrimento engraçado que as palavras carregam consigo. Uma luta que vivia e faz rir, mesmo quando se chora a perda de alguém.
Quando a gente lembra da morte, é perigoso, pois está cansado de comemorar a vida. Comemorar a vida é um pouco cínico, um pouco cético, um tanto enigmático. Na morte não se passa rasteira. Não se tem chance, nem luta verdadeira contra quem sabe ser paciente, esperar. E anda com sua cadernetinha bem organizada, com o segundo certo de bater à sua porta e nhac... foi-se sem nem ver.

A seguir a crônica "Palavras, palavras, palavras", de 21 de maio de 2012, de Ivan Lessa, na BBC Brasil:

"Um amigo erudito, que ocasionalmente vem visitar meu enfisema, como não tem fundos para flores ou presentes, me traz o prazer de sua presença e um papo – monólogo ou preleção, a bem dizer – sobre seu assunto favorito: vida, paixão e morte das palavras.
Sabe que eu tenho o mesmo gosto por elas que ele, embora indigno de beijar seus pés incalustres (obsoleto, português do Brasil: livre de calos). Sempre que posso tomo nota depois de pedir a devida vênia (outro termo nosso em vias de extinção) e fico por uns dias pesquisando e, que me resta?, meditando.
Meu amigo, que ensina inglês para emigrantes lusos e brasileiros recém-chegados à Grã-Bretanha (pois é, nem todo mundo está indo embora), gosta de se dizer poliglota, embora mais de uma vez tenha me explicado, e eu sempre esquecendo, a contradição existente na confecção do termo formado por poli + glota.
"Trata-se de um idiotismo lusitano seiscentista", já me explicou e, tamanha sua verve formal e presença avassaladora, que eu já me esqueci. Em matéria de idiotismos minha cota já se esgotou.
Cá está diante de mim, no entanto, a lição-visita que ele me fez ainda agora, em meados de maio. Fiquei sabendo, pois ele gosta de formar frases com suas redolências léxicas, que – e os não iniciados que se segurem – eu tenho o costume de ouvir música em microfones backpfeifengesicht.
E que o mero pousar de meus olhos num bakkushan poderá, ou não, em mim despertar sentimentos de forselsket, o que, no caso, seria melhor eu evitar ter que recorrer a um desenrascanço. Neste caso, o melhor seria evitar um litost de forma a que outras pessoas no vagão não passem a sentir uma pena ajena de mim.
Ganha um doce quem pegar uma que seja das palavras ou de que trata a longa sentença, que mais parece injeção letal. No parágrafo acima estão enfileiradas palavras em equivalente, preciso ou não, em inglês de alemão, japonês, filipino, português, tcheco e espanhol-mexicano.
Meu amigo, figura sem par, insiste que o referido parágrafo, descodificado por mestres como ele (duvido que haja plural; meu amigo é único), quer dizer, mais ou menos, em rude tradução, o seguinte: "A desagradável pessoa tem uma cara que você gostaria de esmurrar enquanto uma jovem japonesa, melhor vista de costas, inspira uma sensação de euforia quando você se apaixonar pela primeira vez".
Se ele disse é porque é. Não creio que eu vá ter muitas oportunidades de empregá-la. Na verdade, não creio que vá ter uma única oportunidade. Tudo bem. Já me conformei a coisas piores, pelo que peço taarradhin, palavra arábica que significa uma solução satisfatória a todos os envolvidos numa questão.
Mas eu tenho minha forma de apoquentá-lo. Como o dileto (Dileto não é seu verdadeiro nome) se encontra fora do país natal, que é o mesmo meu, gosto de atazaná-lo, ou melhor, espicaçar sua mente viva, com os neologismos que pesco aqui e ali nas águas bravias do mare nostrum cibernético.
Já o pus frente a frente com brasileirismos atuais que o deixaram rubro de vergonha ou ódio, pois ele é difícil de distinguir quando se queima. Taquei-lhe brasileirismos atuais como bullying, point, fashion week, os irmãos Loxas e Lunda e vi-o deixar minha casa falando sozinho entredentes, como se tivesse sido assaltado pelo mundo.
Quebrei a cara uma ou duas vezes, o que era de se esperar: embora da mesma geração minha, matou de estalo balacobaco, e, em português luso, salta-pocinhas e baitola.
De certa feita, fui contra as regras do jogo e deixei-o zonzo por desconhecer o significado de biringaço, que, após revelar-me sua total ignorância, danou-se quando eu expliquei tratar-se de lusitanismo obsoleto significando, nas altas camadas sociais do século 17, uma espécie de guarda-costas alugado a preços de arrasar.
Palavras. Há nelas, embutida, uma tremenda luta corporal. Urge dela participar, mesmo passando rasteira (regionalismo, Brasil)."

Nascimento se comemora, Morte se rememora...


Acho eu que foi uma das penúltimas, pois bom ensaista, cronista, frasista, escritor assim, não é a simples morte que vai impedir de continuar escrevendo. Engraçado ele citar o Millôr, que também foi e continua a escrever, para o deleite de poucos ou tantos (não sei se a morte melhora o gosto sequer o espírito dos humanos. Como é semana de meu aniversário, lembro, sempre, o início e o fim, não sei qual é qual, se o nascimento, que se comemora, ou a morte que sempre se aproxima.
Escrevi essa introduçãozinha para citar a crônica de Ivan Lessa, que passou durante o feriado, em que não li os jornais, nem vi a internet. Muita gente lamentou, mas ele brincou e não lamentou. Porque, acho eu, o destino não se lamenta. E a morte é o único destino, pois não pode ser mudada. O resto você muda. Exemplo disso sou eu, em processo, mas que dou uma paradinha pra comemorar, sempre do jeito mais infantil possível, o aniversário, na quinta-feira. Zombar da morte não é comigo.
Aí vai a crônica de Ivan Lessa, com frases ótimas, ao final... final?

"Orlando Porto. Taí um nome como outro qualquer. Podia ser corretor de imóveis, deputado, ministro, farmacêutico. Mas não é. Trata-se de um anagrama de um escritor francês - e ator e ilustrador bom e autor e figurinha difícil francesa e aquilo que se poderia chamar de "frasista". Feio como um demônio, no meio da década de 50 cansei de dar com ele dando comigo lá pelo Boulevard St. Germain, xeretando o Flore, o Lipp, fazia uma cara que quem ia dizer algo importante e logo sumia na companhia do Jean-Pierre Léaud, aquele maluquinho dos filmes autobiográficos do Truffaut. Dupla estranha. Os desenhos do -esse seu nome, artístico ou de batismo, Roland Topor- eram bacaninhas. Mas sempre foi Orlando Porto para mim. Fez cinema também. O Inquilino do Polanski, o Reinfeld de Nosferatu, do Werner Herzog. Até que bateu o que ocultava seus pés: umas botas estranhas como ele. De vez em quando, numa revista esotérica, dou com ele. Ei-lo numa em inglês com "100 boas frases para eu matar agorinha mesmo". Se chegou ao fim, e chegou, foi pelo cachê. Meros galicismos literários. E aí trago à cena, mais uma vez, porque cismei, mestre Millôr Fernandes. Esse era profissional. Nada a ver com "frasista". Trabalhava com a enxada dura da língua. Nunca para dar a cara no Flore, principalmente com Topor e Léaud. Reli umas 100 frases do Orlando, ou Topor, e não resisti à tentação de, em algumas delas dar-lhes uma ginga por cima e outra por baixo, à maneira do frescobol querido do mestre, só para exercitar os músculos muito fora de forma. Cem razões: Faço por bem menos, mas mais Copacabana e Leblon. Algumas raquetadas minhas em homenagem ao mestre cuja falta continuo sentindo: - Melhor maneira de verificar, antes, se já não estou morto. - Mas não se mata cavalos e malfeitores? - Pelo menos eu driblaria o câncer. - Milênio algum jamais me assustará. - Apanhei-te horóscopo! Pura enganação! - Levo comigo a reputação de meu terapeuta. - Pronto, agora não voto mais mesmo! Chegou! - Aí está: uma cura definitiva para a calvície. - Enfim cavaleiro do reino de sei lá o quê. - A vida está pelos olhos da cara. Pra morte eles fazem um precinho especial, combinado? - Enfim, ano bissexto nunca mais. Esses ficam para o Jaguar. O resto pro Ziraldo. - Ao menos é uma boca de menos a sustentar. - Só quero ver quanta gente vai sincera no meu funeral. - Pronto! Inaugurei estilo novo: Arte Morta. - Sabe que minha vida não daria um filme. O livro eu já escrevi. Deixem o desgraçado em paz, peço-lhes. - Custou, mas estou acima de qualquer lei que vocês bolarem aí. - Levou tempo, mas cortei enfim meu cordão umbilical. - Roncar, nunca mais. Nem eu nem ninguém ao meu lado. - Que desperdício nunca ter fumado em minha vida! - Consegui preservar o mistério sempre girando em meu torno. - Maioria silenciosa? Essa agora é comigo. - Na verdade, nunca me senti à vontade nessa posição incômoda de cidadão do mundo. - Ei, juventude, pode vir que pelo menos uma vaga está aberta. - Emagrecer é isso aqui. - Agora é conferir se, do outro lado, sobraram tantas virgens assim. E assim, cada vez que um"frasista" passar por perto de mim, leve uma nossa: minha e de Millôr. Dois contra um a gente ganha mole.”